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15 de nov. de 2013

ECA!!!! DESORDEM E REGRESSO

Hoje publicarei neste meu espaço um texto um pouco diferente mas que considero de muita importância. Meu trabalho com a cultura do oriente médio de resgate e manutenção de suas raízes não teria valor nenhum se eu também não criasse raízes no país que vivo e amo. Mas parece que não nos é permitido ter esta identidade histórica e cultural, não nos é permitido ter uma história e mantê-la viva. O que seria do Pathernon se tivessem ampliado a pequena estradinha estreita que dá acesso àquele grande monumento??
Enfim, transcrevo aqui meu desabafo postado hoje no facebook

ECA!!!!! FIQUEI COM VONTADE DE VOMITAR!!!!

TRÂNSITO X ABUSO DE PODER X EXPLORAÇÃO X FALTA DE SENSO DE IDENTIDADE HISTÓRICA E CULTURAL X OTÁRIOS (ESTES SOMOS NÓS)

Semana passada (09/11 a 12/11/2013) tirei uma mini férias e fui para Ilhabela (Litoral Norte paulista). Feliz da vida segui rumo a  Rodovia Tamoios (SP099), uma estrada que tem grande significado para mim e que conheço como a palma  da minha mão após 38 anos de utilização. 

Rodovia Tamoios - SP099
Para mim é sempre uma grande emoção seguir por aqueles 82km de uma estrada construída em torno de uma natureza rica, dos quais 27km são de uma serra linda em plena vegetação nativa da Mantiqueira com lindos trechos com vista panorâmica para o litoral!!! Tenho comigo nas minhas entranhas a sensação de cada curva com as quais meu pai costumava brincar qdo eu era pequena cantarolando em grego e esticando as notas da canção a medida que as curvas eram mais acentuadas. Momentos realmente felizes e plenos com amigas e pessoas muito amadas. Ainda lembro do suor frio em minhas axilas quando eu desci aquela serra pela primeira vez como piloto, no meu primeiro carrinho, um Uninho branco que só tinha 4 marchas e bancos de plástico, e com trilha sonora do Giannis Pários (Ta Nissiotika - músicas de ilhas) assim como meu pai costumava fazer, ainda sinto as lágrimas de emoção descendo pelo meu rosto.
O Litoral Norte de São Paulo sempre me trouxe um "quê" de Grécia, talvez pelo mar calmo e azul.


Mas estas lágrimas já não eram mais de emoção na sexta-feira passada (08/11/2013). Após um longo afastamento deste lindo litoral de quase 2 anos, foram lágrimas de indignação, de ojeriza, de tristeza e de um sentimento de perda e de impotência gigantes.
Vista panorâmica da Serra - a dir a "montanha Gorila", como eu e minha
irmã apelidamos quando criança.
As 9 horas de trânsito e transtornos para se chegar ao destino no qual a média é de 3 horas foi o menor dos fatores. Depois de trabalhar absurdamente durante meses de domingo a domingo, conseguir tirar 4 dias de descanso e perder 5 horas deste tempo precioso no meio de obras, ainda foi o de menos. A minha maior indignação é A OBRA!!!!
Vamos começar com as placas: DUPLICAÇÃO DA TAMOIOS - GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Óooohhhhh, vamos aplaudir!!! eca.... fala sério???
desde quando destruir a natureza para duplicar uma estrada merece aplausos????

Obrigada políticos e empresários por destruir a natureza e
as minhas memórias. É uma pena que as próximas gerações
não poderão mais apreciar a beleza da nossa natureza, e
irão para o litoral como minhocas por baixo da terra,
destinados à miopia e às prisões de concreto! ECA!!
E onde estava uma placa prévia avisando das condições da rodovia??? não, não tinha nenhuma, em toda a extensão da Ayrton Senna e da Carvalho Pinto, e nem na entrada da Tamoios havia nenhum aviso. Apenas mais 2 pontos de pedágios além do que já existia há 2 anos.
segunda eca: a obra que já dura mais de 1 ano está praticamente falindo com os comerciantes locais pois todos que tem conhecimento da obra não seguem mais por aquele caminho. A famosa lanchonete "Vaca Preta", que faz uma calabresa clássica, simplesmente vazia... os outros estabelecimentos então, às moscas, ninguém pensa nos trabalhadores que precisam destes empregos??

Claro que não, pois serão beneficiados com o "progresso"!!!!

Então várias coisas começaram a vir na minha cabeça, licitações, leilões, pedágios... dinheiro, dinheiro e mais dinheiro para aqueles que já tem muito!!! dinheiro de quem???? meu, seu, do coitado do trabalhador que perdeu seu emprego...
enfim, a eca final e apoteótica foi no km 60, INÍCIO DO TRECHO DE SERRA, FIM DA OBRA DE DUPLICAÇÃO!!!!
o que??????????????????????? pra que então???? ampliar 60km de estrada para todos afunilarem nos últimos e mais delicados 22 quilômetros??? quase saí do carro para vomitar!!!!
fiquei indignada!! não é possível eu pensava!!!!

mas daí claro que não é possível, pois precisamos de mais licitações, mais leilões, mais pedágios, mais dinheiro, e mais destruição da natureza!!!

veja bem, não sou contra o progresso, mas também não posso aceitá-lo a qualquer custo!

A Rodovia Tamoios é um patrimônio paulista, um patrimônio histórico e cultural, foi pavimentada em 1957 e teve melhorias nos anos 60 e 70, com o nosso dinheiro, e trouxe melhora de vida para a região. É uma excelente estrada, e nunca teve pedágios pois é nossa, não de nenhuma empresa privada.

Fazer uma obra que custa mais de R$500.000.000,00 com o nosso dinheiro para leiloar para uma empresa que terá uma concessão de utilização de 30 anos e ainda cobrará pedágio é um absurdo, uma afronta, um assalto a mão armada!! E não pára por aí, pois ainda terá o trecho da serra, com muito mais complicações pois de um lado está a montanha e do outro o penhasco!!!! Ou seja, muito mais dinheiro (já há estimativas de mais de R$2 bilhões) e destruição!


Praia Martins de Sá - Caraguatatuba
será que cabe mais alguém???

E não posso deixar de me perguntar: pra que??? o litoral paulista nem tem estrutura para mais turistas nas altas temporadas. Falta água, falta rede de saneamento adequada que não polua o mar e as águas, falta estrutura comercial, falta até espaço na areia e no mar!!!! Sobra pernilongos, baratas, borrachudos, filas, sujeiras, viroses e daí falta também atendimento de saúde!

E no final???? ECA!!!!!!!!!!!


É isso aí!!!! Viva o progresso!! Que tal duplicar também a Rio-Santos, a Mogi-Bertioga e trocar seus nomes para nomes de políticos e empresários sujos?? Eca!!!!!!!!!!!!

OBS: Segundo a Associação Brasileira do MP do Meio Ambiente, a obra gerará o maior desmatamento da Mata Atlântica, 370 mil metros!

14 de ago. de 2013

Dança do Ventre - A Beleza do Simples

A Dança do Ventre hoje conquistou todas as partes do mundo, e é executada por mulheres de todas as idades e etnias. Isso é maravilhoso, entretanto se quisermos ser fiéis à dança do ventre como tradição da cultura árabe precisamos tomar muito cuidado com o efeito “telefone sem fio”.

Sou uma apaixonada por esta arte e dedico muitas horas assistindo vídeos de bailarinas de diversas regiões do mundo e venho percebendo que cada vez mais esta dança tem se distanciado de sua essência. Cada vez mais a preocupação das bailarinas é em impressionar o público com sua qualidade técnica, agilidade, movimentos inusitados e beleza física. Muitas vezes observamos movimentos, passos e elementos que nunca fizeram parte da cultura árabe.


Sei que a arte não é estática, que a arte evolui, que cada bailarina pode e deve colocar a sua personalidade em sua dança. Sei que há uma grande diferença entre uma dança cênica e uma dança “feita em casa”, mas se começarmos a nos distanciar da essência da dança oriental, daí simplesmente deixa de ser...

E o que é essa essência?

Vou fazer uma analogia: A HISTÓRIA DO FEIJÃO

“Sabemos que o arroz com feijão é o prato que mais representa o povo brasileiro. Imagine então a seguinte situação:
Você aprende com sua mãe e avó como fazer o feijão. Você aprende que precisa usar o feijão carioca ou o jalo para fazer este prato típico. Aprende que é preciso deixa-lo de molho por algum tempo para poder cozinha-lo. E o principal, aprende que para temperá-lo basta sal e alho, e se quiser pode adicionar cebola e toucinho. O arroz deve ser o branco, também temperado com sal e cebola. Mas que todos estes simples ingredientes, feitos e adicionados na 
proporção e ordem certa vão proporcionar um prato de sabor maravilhoso e muito tradicional do Brasil.


Um chef de cozinha francês tem a oportunidade de experimentar esta receita, e resolve colocar no cardápio de seu restaurante na França. Mas ele acha muito simples, e na verdade, ele nem sabe muito bem todos os passos do processo pois ele só experimentou, mas adorou e quer muito fazer. Então ele compra um feijão na França que não é o carioquinha ou jalo pois lá não se encontra este tipo (isto é uma ficção, eu não sei se existe ou não Ok). Daí ele resolve incrementar o prato, ao invés do arroz branco, ele prepara um arroz tipo “a grega” e no feijão ele adiciona outros temperos, mostarda, salsinha, tomilho e pimenta rosa. Ele percebe que se deixar o feijão com caldo, a apresentação do prato não fica tão bonita, então ele deixa o feijão mais seco, e para enfeitar a iguaria e dar um toque especial ele coloca como acompanhamento cogumelos.
O prato faz um baita sucesso, o restaurante fica famoso por ter um prato brasileiro no cardápio.
Você vai morar na França e fica com saudade de comer feijão, daí as pessoas te indicam o tal restaurante. Você fica empolgadíssima, vai lá e pede o prato, e então, a decepção!! Você gostou da comida, o prato era gostoso, interessante, diferente, mas definitivamente NÃO ERA O FEIJÃO BRASILEIRO!!!”

Como você se sente? Frustrada, enganada, chateada, enfim cada pessoa vai reagir de uma forma, mas o importante é que você sabe que aquele prato não representa sua cultura nem suas tradições.

Quero apontar várias coisas neste texto:
1)      Se você não quer fazer da forma tradicional, tudo bem, só não venda seu produto como se fosse;
2)      Se você quer fazer o tradicional, se você quer aprender a essência da dança, beba da fonte,
3)      Ser simples não é ser ruim, ser simples não é fácil, ser simples tem suas qualidades, ser simples não é ser pouco,
4)      Os passos e movimentos tradicionais da dança do ventre não são muitos, mas saber coloca-los na hora certa, com a dinâmica certa, com a ginga certa é o mais importante, completamente conectada e entregue a música, aí está a grande questão. Ao invés de se dedicar um tempão para aprender o “passo da moda”, dedique-se mais em pesquisar sobre a cultura e a música oriental, mas sempre de fontes fidedignas, prefira sempre os originais, mas lembre-se, nem todo brasileiro sabe fazer feijão.

Muita gente diz que minha dança é simples, e honestamente não me ofendo com isso, pois esta é a essência da dança oriental. Eu como bailarina de dança oriental tenho que me preocupar em traduzir em meu corpo a música de forma prazerosa e de forma que o público possa entender. A impressão de ser simples se deve pelo fato de ser completamente entendível!! Você entendeu a minha dança completamente, ótimo, esta era minha intenção, é sinal que eu consegui te passar uma mensagem claramente, e com muita técnica sim, pois senão a geometria e harmonia dos meus movimentos não seriam perceptíveis.
A partir do momento que o público não consegue acompanhar o que eu faço e que eu tenho que pensar para fazer, deixou de ser dança oriental, pois quando isso acontece há uma desconexão do público e da bailarina com a música, e dança e música na cultura oriental é uma coisa única, somos um uníssono, todos os instrumentos produzem um único som, não há harmônicos na música árabe, um dos pilares da música árabe é sua forma melódica e o meu corpo deve ser esta melodia de forma plena.
Eu como bailarina devo ser a música, sou um instrumento a mais na orquestra, a música me rege, se não há mudança de frase musical, não há mudança de passos e movimentos, se não há floreios na melodia, não haverá floreios em meu corpo. Eu devo seguir a música em tudo, em suas intenções, dinâmicas, energia, e isto não quer dizer seguir cada “plin” do qanoum, isto quer dizer estar entregue totalmente deixando o som reverberar no corpo.
A música árabe é cíclica, sendo assim a dança também deve ser, ou seja, não há nada de errado em repetir o mesmo movimento se a música o solicita. Esta circularidade é o que proporciona o êxtase, o prazer, a viagem do público em seu corpo, se mudarmos de movimento a cada segundo, não se estabelece a conexão.
Foto: Flávia Pastorelli/ Bailarina: Cristina Antoniadis

A essência da dança oriental está no prazer sentido pela bailarina e compartilhado com o público, e para haver prazer é preciso que o corpo esteja relaxado e desconectado com o pensamento de querer impressionar!
Quanto mais dançamos a mesma música, mais íntima dela nos tornamos, e mais podemos explorar de forma natural suas minúcias.
Portanto, se você quer dançar com estilo realmente árabe, pense em tudo isso!! Abaixo, alguns vídeos para ilustrar e frases para refletir.

“A Simplicidade é o último grau da sofisticação” – Leonardo da Vinci

“Que ninguém se engane, só se consegue a simplicidade através de muito trabalho” – Clarice Lispector

“O assunto mais importante do mundo pode ser simplificado até o ponto em que todos possam apreciá-lo e compreendê-lo. Isso é, ou deveria ser, a mais elevada forma de arte.” – Charles Chaplin

“A Simplicidade é o último degrau da sabedoria.” – Khalil Gibran


Serena Ramzy

Cristina Antoniadis

Fifi Abdo